sexta-feira, 4 de novembro de 2011

É uma merda fazer 30 anos

Desculpem-me os balzaquianos bonitos, em forma, bem-sucedidos e felizes, mas fazer 30 anos é uma merda. Eu já o sabia num inferno astral de um ano ao completar os 29. Não alcançaria, em um ano, o que sonhava para mim: um cantinho meu, um carrinho confortável, um bom emprego e uma boa viagem por ano. Mas, poucos meses antes do dia da virada da maldita dezena, as coisas tinham melhorado. No entanto, isso seria por pouco tempo. E, no íntimo, eu parecia saber disso porque chamei mal e pa(o)rcamente os amigos (mandei um e-mail ao fim do dia da véspera) para uma “comemoração”.

Não havia o que celebrar, apenas algumas mudanças recentes. Mas, ok, dei o braço a torcer e ouvi pessoas próximas e queridas que não me deixavam passar a data em branco. Escolhi um boteco que costumo, quer dizer, costumava frequentar (vocês vão entender o porquê do passado) e até me surpreendi com a presença de bons amigos. A surpresa foi porque o e-mail de aniversário enviado em cima da hora foi proposital, não queria muita gente festejando o que não havia para ser celebrado. Muitos diriam, porque não disseram (ufa!), “ah, mas são 30 anos!”. Eu apenas diria e digo: grande coisa, para não dizer, grande bosta, fazer 30 anos.

E não sofro pela ausência daqueles sonhos que muitas mulheres se veem vestidas de noiva e, menos ainda, da pressa em ter filhos porque o corpo começa a entrar em decadência para gerar uma vida. Nisso, acho que só nisso, acertei e agradeço todos os dias à minha santa pílula. Agradeço, mas com ressalvas. Apesar de não ter vindo uma Ritinha ao mundo, a santa pílula me trouxe, de brinde, um melasma. O que é isso? Uma mancha incurável no rosto por anos e anos ininterruptos de ingestão de hormônio para enganar e proteger meu organismo. É... E aí haja ácido, protetor solar, corretivo e pó para disfarçar o que muitos não enxergam, mas meu espelho denuncia a cada mirada.

Muitos me condenam pela alergia que tenho pela ideia da reprodução. Mas se não consigo nem manter a mim própria quanto mais a um projeto de mim mesma. Mas, enfim, agradeço a minha pílula por isso e por não ter me trazido, até hoje, um derrame, uma trombose, um câncer ou um AVC. Isso porque, se não bastasse a bomba hormonal, sou fumante inveterada, assumida e sem previsão de largar o vício. E a combinação dos dois não é nada saudável, digamos assim.

Então, voltando aos famigerados 30 anos. Por ter sido induzida a “comemorar” mais um ano de vida, tomei várias cervejas no bar e um espumante em casa para quem sabe, inebriada, esquecer a data e ver a saída como qualquer ida a um boteco. Nada demais, infelizmente, aconteceu naquele dia nem nos posteriores. Mas comecei a fazer planos de economizar heroicamente e, dali a um ano, poderia quiçá pensar algo realmente grande: ter meu cantinho. Ou, pelo menos, fazer uma boa viagem e concretizar o plano de conhecer o México.

Mas, dois meses depois, recebo a notícia de que, em breve, eu estaria desempregada. No momento, também pela surpresa, não levei a notícia tão a ferro e fogo. Alguns colegas haviam passado pela mesma situação e não ficaram muito tempo sem alguma coisa. Mas esqueci de pensar, naquele instante, que isso se tratava de Ana Rita e, como ela sou eu, comigo tudo é possível, até passar um ano-novo no sofá com meus dois grandes companheiros do dia a dia desempregatício: meus meninos, isto é, meu dois gatinhos (os melhores filhos, no caso, os melhores sobrinhos, que eu poderia ter).

É desesperador. Digo como quem alerta um desavisado. O peso de dizer “estou desempregada” se assemelha a uma doença contagiosa tanto para o portador como para quem o rodeia. E esse objeto direto, passageiro ou insistente, vem acompanhado – na promoção pague um, leve 11 – de uma depressãozinha (que pode ser amenizada com comprimidos diários de fluoxetina), choros sem hora marcada, olhos inchados, solidão (a falta de renda obviamente muda a sua rotina de (não)trabalho assim como a sua vida social), cortes brutos no orçamento (para não falar em dívidas), brigas no relacionamento (uma desempregada não pode se dar ao luxo de acompanhar o namorado na vida social), visitas constantes à geladeira, banhos demorados (para ver se o tempo passa mais rápido), insônia, uma preguiça absurda para sair da cama e uma bela falta de vaidade.

Inevitavelmente, os desempregados padecem também de algumas intolerâncias. Jamais cumprimente automaticamente um desempregado com “tudo bem?”. Se ele decidir ser franco, você não vai querer ouvir as lamúrias. Tampouco o console com o clichê “vai dar tudo certo”. Isso só funciona em filmes, na maioria deles. E um desempregado, ao menos no meu caso, sofre com uma forte tendência ao pessimismo. E aquela máxima “uma desgraça nunca vem sozinha” parece funcionar mais do que nunca. “Se ainda não deu certo é porque não chegou a hora ou o fim”. Esta frase me soa como o anúncio da morte.

Como ajudar um desempregado? Dê-lhe dicas de trabalho, oportunidade. Se não, se for muito, mas muito próximo a ele, convide-o para algumas cervejas, mas, é claro, você terá de bancá-lo. E, apesar de a taxa de desemprego se manter estável no país, não são muitos os que ganham bem para sustentar alguém numa mesa de bar. Mas tem que ser um lugar chinfrim porque desempregado não está muito a fim de se arrumar. E isso normalmente ajuda na conta menos salgada. E se você não puder fazer nada disso, é melhor esquecê-lo, espero, temporariamente. Eles precisam de tempo para conseguir um emprego, se curar e voltar à vida. Não estou exagerando. Um desempregado é meio que um ser morto, invisível, excluído. Já disseram que tempo é dinheiro. E eu digo que o mundo é dinheiro, a vida é dinheiro. Sem isso, é óbvio, não se sobrevive. Mas tem o lado menos explícito. Passa-se realmente a não ter uma vida, a não ter planos, a encobrir os sonhos, a não poder sequer dar uma espairecida. E isso torna a vida, ou a sobrevivência, uma tortura.

Portanto, se está trabalhando, agradeça o emprego que tem. Reclame, isso faz parte do ser humano. Mas não reclame ao ponto de ofender quem não tem um para poder reclamar. Espero que essa experiência de autoconhecimento não perdure por muito tempo nem para mim nem para quem esteja na mesma situação. E tampouco a desejo à pessoa que menos gosto na vida. “Isso não é de Deus”, como dizem. Mas hoje entendo como é sofrível ser desse grupo. E, no meu caso, os 30 anos e o desemprego se misturam. Não sei falar de um sem falar do outro. E sobrou pra você, 30 anos. Ou seja, fazer 30 anos é uma merda.

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

O mendigo da Esplanada

Divagações sobre um homem à margem da sociedade que circula entre os prédios do Poder Executivo da capital federal

Quem trabalha na Esplanada dos Ministérios ou vai lá com frequência provavelmente sabe de quem vou falar. Durante os quase dois meses em que prestei serviço num dos prédios ao lado direito de quem segue em direção ao Congresso Nacional, prestava atenção a uma figura que perambulava todos os dias entre os imponentes edifícios. Ao chegar pela manhã, ao sair para o almoço, ao descer para fumar, era raro não me deparar com ele, um homem de uns 35 anos – mas não me levem a sério, sou péssima para chutar a idade das pessoas. Posso dizer que é negro, de barba, nem magro nem gordo, de estatura média.

O que me intrigava neste homem não era o fato de apenas encontrá-lo sempre nas redondezas porque, é claro, sempre vemos aquelas mesmas pessoas no local onde trabalhamos. Seguia-o com o olhar porque sempre o via andando ou deitado no chão da Esplanada, com suas vestes rotas, pés descalços, mas, nunca, nunca mesmo, o vi pedir nada a ninguém que por ali caminhasse. Nem dinheiro, nem comida, nem cigarro. Posso apenas dizer que já o vi pegar as bitucas jogadas ao chão pelos fumantes que passavam próximos a ele. Talvez, em um desses momentos que não presenciei, ele tenha pedido a alguém, pelo menos, um isqueiro emprestado.

Nas lentas subidas do elevador e nos rápidos instantes de manutenção do vício da nicotina, divagava sobre aquela figura que via todos os dias. O que fazia da vida? Tinha família? Como comia? Tinha casa? Tinha tido problemas com drogas? Era impossível ter qualquer pista daquele solitário caminhante da Esplanada dos Ministérios. E era sempre só. Não tinha um amigo e tampouco era acompanhado pelo melhor amigo do homem, um cachorro para companhia mútua. Lembrava-me, nesse instante, de uma figura que também atraiu a minha atenção em São Paulo, nas proximidades da Rua Augusta. Este era já um senhor de cabelos grisalhos às margens da sociedade que perambulava sempre acompanhado de seu enorme cachorro. O animal parecia-me doente, pois era carregado numa espécie de carrinho de supermercado. Encontrei-os umas três vezes enquanto estive na metrópole e admirava o carinho entre ambos.

Mas com o mendigo da Esplanada nem isso, ninguém, nem um animal, para fazer-lhe companhia, para dividir um prato de comida, para diminuir a solidão. Como ele conseguia viver os dias, as horas, os minutos, sem ter um papo e sem ter um bicho que seguisse seus passos? Aprecio alguns momentos de solidão, mas me incomodam demasiadamente quando se prolongam por vários dias. Acredito que o ser humano não tenha sido feito para ser só porque a vida é uma eterna e constante troca. Mas para ele não parecia fazer falta, ou fizesse e ele precisasse aceitar a sua condição. Talvez alguém já tivesse se aproximado dele e ele tivesse afastado qualquer interação com o mundo que o havia marginalizado ou que ele próprio havia repelido. Talvez ele não aceitasse o mundo da forma como o é e por isso preferiria viver no acostamento a viver na pista principal ou na via de mão dupla.

E outra pergunta para que tampouco ja - mais tive resposta, nem mesmo uma pista: por que não pedia nada a ninguém? Sempre vejo os pedintes pedindo. Sempre vejo os mendigos mendigando. Definitivamente, ele não é um pedinte, pelo próprio significado da palavra. E mendigo? Pelas definições do Dicionário Houaiss, ele não o seria porque não pede esmolas. Mas “valer- se da caridade alheia”? Nunca o vi pedindo, mas talvez ele sobrevivesse da ajuda dos que eram invisíveis aos meus olhos. Como todos, ele precisa comer. E acredito mesmo que provavelmente alguém lhe entregasse um prato ou um pão em determinadas horas do dia. E, por isso, apelidei-o de o mendigo da Esplanada. Precisei dar nome para saber como me referir a ele.

Às vezes o via caminhando com seu cobertor sobre um dos ombros. Às vezes o via deitado – momento em que eu mais fantasiava a respeito de sua história – sob a copa de uma grande árvore, de barriga pra cima, pernas estendidas, olhos abertos, ou fechados. Esse detalhe eu não conseguia ver, pois tinha receio de me aproximar e incomodá-lo com a minha curiosidade. Assim como já quis descobrir quem era ele, mas seu silêncio e sua individualidade impunham tal respeito que me impediam, naturalmente, de qualquer investida. Cabia a mim apenas imaginar como seria a vida dele.

Já não trabalho mais por lá, mas, de vez em quando, a imagem do “mendigo da Esplanada” volta à minha mente como a me perguntar quem é aquela pessoa tão sozinha, calada, aparentemente autossuficiente e, na realidade, tão próxima, mas ao mesmo tempo tão distante. No centro do poder do Brasil, por onde circulam servidores públicos e autoridades do governo, entre as obras de Oscar Niemeyer que atraem tantos turistas e maravilham os brasilienses, estava ele, com sua simplicidade a se destacar.

Quiçá eu tivesse trabalhado mais tempo por lá e soubesse algo de sua vida, tivesse ouvido a sua voz ou mesmo ele me pedisse algo. Ou talvez alguém me contasse causos daquela pessoa que eu via apenas ali, entre os ministérios, andando ou descansando, ou dormindo. Mas um dia outras figuras provavelmente vão me intrigar e o “mendigo da Esplanada” será apenas uma lembrança quieta entre tantas outras inquietas. E é bom que não se fechem os olhos para não enxergá-las (pessoas). O dia em que o mundo estiver completamente cego para figuras como o mendigo da Esplanada e o senhor e seu cão, certamente será o dia em que o mundo não mais se perceberá como mundo.

Crônica publicada na 7ª edição da revista MeiaUm

sábado, 24 de setembro de 2011

Um mês

Eu que sempre amei a imprevisibilidade, as surpresas, não suporto a ideia de não saber nada do que virá, nem sequer, do que não virá. Quer dizer, imagino a inércia, mas, no fundo, espero que não seja ela a convidada repentina e rotineira. Como é possível tudo mudar tão inesperadamente? Seria um castigo? O que fiz de tão errado? Sonhar? É, talvez eu tenha sonhado demasiadamente, talvez eu tenha me superestimado, imaginado uma vida em ascensão, lenta, mas sem pausas. Mas hoje se completa um mês de interrupção de planos, de lágrimas que vêm e vão, de leituras, espero, não em vão. Sinto-me a par de tudo que acontece, nada do que acontece me afeta. Estou só. Todos estão envolvidos em suas vidas movimentadas, com o saldo a sair e entrar. O meu vai pingando dia a dia pelo ralo. Conto os centavos para que a receita de dias passados me mantenha pelo maior tempo possível. Não sei planejar a vida daqui uma semana. O fim do ano se aproxima e ele parece ainda mais terrível que os anteriores. Dois anos atrás, me preparava para realizar a viagem dos meus sonhos. Hoje não sei o que fazer com os dias mais lentos de toda a minha vida. De fato, nunca havia pensado sobre essa situação, jamais me preparei para esta condição. E, por mais que eu pergunte, não há respostas. A única frase que se me repetem... “Vai dar tudo certo”. Por que dizem isso? Uma forma de dizer qualquer coisa? Uma forma de ter que dizer alguma coisa? Como vai dar tudo certo? Eu não sei dizer nada a mim mesma. Desaprendi as leis básicas da vida. Aprendi mais um lado triste da realidade. Experimentar, como digo, é, definitivamente, o verbo da minha vida.

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Mau tempo

Segregaram-me. Encarceraram-me. Vivo na cela de meus pensamentos. Estes me ferem gravemente. Vejo o mundo lá fora. Não pareço mais pertencer-lhe. As horas que antes voavam, agora passam como a me torturar. Os pesadelos não habitam mais apenas as noites. Acordar é como entrar num sonho ruim repetitivo. Os dias agora são todos tão iguais. Nem uma boa notícia. Vivo uma reportagem mal escrita que ninguém editou. Ouço um violão distante. Ele não me leva pra fora, traz-me mais para dentro. A trilha sonora da velocidade de minhas lágrimas. Meus pés não ultrapassam a porta. Não há motivo. Não sinto calor. Sinto frio pela desnecessidade de locomoção. Olho o espelho. Não me reconheço. Ou jamais me conheci. Meus sonhos foram inundados, meus planos, fuzilados. Resta a esperança de a página virar...

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Mulheres ao volante

Apesar de ser mulher e defender meu gênero na direção, algumas podiam ser mais atentas e tentar evitar a vergonha que nos causam. Esses dias, vi uma delas subir a calçada de uma quadra comercial na Asa Norte e chegar a milímetros do degrau de um estabelecimento. Nem quis pensar se estivesse passando alguém no momento. Acredito que ela devia ser um daqueles motoristas de domingo (era domingo), pegou o carro – bacana, diga-se de passagem (daqueles grandes de “pai ou mãe de família”) – e não sabia se a ré era pra cima, pra baixo ou vou eu lá saber como anda a modernidade automobilística. Fico irritada quando as mulheres fazem barbeiragens nas ruas. Só contribui mais ainda para a máxima “mulher ao volante, perigo constante”. E eu, acredito até hoje, não faço parte desse grupo ameaçador. Nunca bati o carro, mas tive meu automóvel lesado por motoristas homens por duas ou três vezes (uma nunca vou saber, mas um shopping se responsabilizou pelo estrago). Mas admito que careço daquela proteína que dá norte às pessoas. Nasci em Brasília e, até hoje, me perco nas tesourinhas, além de que jamais poderei viajar sozinha. Quem já foi meu (minha) companheiro (a) por aí afora sabe bem do que estou falando. Uma amiga, inclusive, me proíbe de qualquer aventura pelo exterior sem uma pessoa devidamente orientada ao meu lado. Nem um mapa é capaz de me ajudar. Mas, voltando à brincadeira anterior, peço: “Mulheres, controlem-se no banco do motorista”. Nós somos capazes, sim, de dirigir com prudência, assim como mostramos nossa competência em diversas áreas. Contenham-se, por favor! E que eu não “pague a língua” por este papo.

Publicado na seção Papos da Cidade da 6ª edição da revista MeiaUm

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Oração do desempregado

Empregador que estais no comando,
esperançoso seja o vosso contrato,
vem a nós a vossa empresa,
seja feita a vossa seleção
assim no mercado como no olho da rua.

O pão nosso de cada dia nos dai sempre,
perdoai-nos as nossas falhas,
assim como nós perdoamos
a quem nos tem dispensado,
não nos deixei cair em desespero
mas livrai-nos do desemprego.

Amém.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Respeito, pelo menos, aos fumantes

Não quero aqui fazer apologia ao cigarro, muito menos tecer elogios ao vício ou aos viciados. Mas, fumante que sou, me incomodam os narizes torcidos em minha direção ao inalar a fumaça do meu Marlboro Light em lugares permitidos. Nos fumódromos ou em áreas abertas – sou uma fumante respeitosa, mesmo em locais ao ar livre ou em bares sempre olho em volta para ver se quem está mais próximo pertence à tribo em extinção –, há sempre os chatos de plantão que gostam de incomodar os outros com o seu incômodo. Não que eles não tenham razão, mas fumódromos são para quê? Por que um não fumante que odeia cigarro se senta numa área reservada aos fumantes?

Coisa pior são aqueles comentários que se tem de ouvir quando se está solitariamente pensando na vida e fumando seu cigarro tranquilamente. “Você é tão bonita para fumar!” “Você não combina com cigarro.” “Você sabe que cigarro faz mal?” Antigamente, perguntas ou afirmações desse tipo ainda me faziam dialogar com a pessoa ou tentar ser educada. Hoje simplesmente ignoro ou dou um sorrisinho amarelo para o indivíduo se tocar do comentário cafona e sair de perto.

Pior ainda é se você reparar em quem critica um fumante. Já prometi a mim mesma que se o próximo chato que aparecer for gordo, ele que reze para eu me segurar e não ser obrigada a dizer: “Eu controlo o que você come?” Um é viciado em cigarro e outro é viciado em comida. Por que diabos então censurando o mau hábito do outro? Nada contra quem está acima do peso, pois eu também preciso enxugar as gordurinhas. Mas, como se diz por aí, cada um no seu quadrado. Uma amiga minha já cumpriu o juramento. Quem sabe eu não me junto ao time. Fumantes, uni-vos! Vamos pedir respeito e nos juntar nos fumódromos, se é que existe um perto de você, porque até isso estão tentando eliminar.

Publicado na seção Papos da Cidade da 5ª edição da revista MeiaUm

terça-feira, 28 de junho de 2011

Perfil - Lincoln Carlos Silva

O garçom-amigo (ou amigo-garçom) reúne fiéis seguidores do seu bom atendimento tanto na vida real como nas redes sociais. Atender bem o público, além de função deste gentleman, é uma forma de fazer e cativar amizades

Ana Rita Gondim

“Vamos àquele bar novo que abriu na Asa Norte?” É assim que o jornalista Leandro Galvão, de 30 anos, convida, obviamente em tom jocoso, a namorada para um dos bares mais tradicionais da cidade. De mesmo nome, mas mais recente, o Beirute da Asa Norte atrai assíduos frequentadores todas as semanas.

O casal e os amigos procuram uma mesa, sempre que possível atendida por um determinado garçom. Não menosprezando os outros, também muito queridos pela turma, mas Lincoln tem todo um serviço especial e chega a “mimar” seus clientes beirutianos. “Costumo dizer que ele não é apenas um garçom, mas quase uma babá, tamanho é o cuidado que tem em sempre deixar os clientes bem assistidos”, diz Leandro Galvão.

Quando pode, ele mesmo recebe os amigos (sim, amigos, ele vai aos aniversários quando o trabalho dá uma folga, por exemplo) com um abraço, um aperto de mão e aponta logo a área onde está atendendo naquele momento. Sem nem precisar pedir, chega logo uma Heineken geladíssima, a preferência masculina. Parte desses hábitos Lincoln adquiriu como gerente no restaurante Tucunaré na Chapa e depois como garçom na Choparia Sudoeste. No Beirute, Lincoln completará quatro anos em setembro. São quase 15 anos na função de bem atender o público.

Os “mimos” do goiano de Nerópolis vão desde ciceronear os clientes até servir doses camaradas e cortesia de porçãozinha de queijo coalho e azeitona. Além da festa inicial, é provável que se surpreenda, depois de fechar o bar, quando, a caminho de casa, pode-se levar um susto com a buzinada de Lincoln a se despedir do cliente-amigo.

Lincoln virou sinônimo de excelente atendimento. Quando se decide mudar o destino social ou alcoólico da noite, sempre alguém solta uma frase na mesa: “Que saudades do Lincoln!”. Até quem não aprecia as mesas grandes, os bancos enormes que atrapalham na hora do aperto (banheiro) e o preço acima da média se rende ao bom serviço: “É caro, mas vale a pena”, costuma-se dizer.

Uma cliente fidelíssima ao atendimento do gentleman é a contadora Fabiana Masaki, de 28 anos. “Tenho certeza de que se um dia ele sair do Beirute, nós vamos atrás, pra onde ele for”, afirma, sem o menor pudor ou pieguismo. A seguidora lincolniana também lembra o churrasco em comemoração ao aniversário do amigo Leandro Galvão, a que o garçom e a esposa (a vendedora Maria Isabel, 28 anos) compareceram, além de presentearem o amigo flamenguista com uma caneca do time.

Não bastasse a rede de amigos que agrega no Beirute, Lincoln os reúne nas mídias sociais, como o facebook. Quando a turma demora a aparecer na esquina da 107 Norte, ele os convida carinhosamente com a confissão de saudades que sente dos seus reais e virtuais seguidores. “Lembro que um dia eu estava no Beirute com uma amiga e comentei uma frase engraçada que o Lincoln tinha escrito no facebook. Minha amiga ficou de cara que eu tinha o facebook dele. E eu disse que ele era meu amigo”, relata Fabiana. No entanto, ao ir para um concorrente, não se espante se um dia receber a declaração de “traidor” na rede, pois Lincoln prefere seus amigos sempre por perto. “O Lincoln é um cara muito gente boa, que conquistou a galera. É difícil começar uma amizade assim, entre garçom e clientes. Pelo menos eu nunca tinha visto”, confessa.

Estar perto dos amigos é um dos motivos pelos quais Lincoln cativa sua freguesia, seja no bar ou na rede mundial de computadores. “Quanto mais você tem contato, fica a amizade. E amigo você não pode esquecer nunca. E esse site ajuda muito você a se sentir mais perto das pessoas de que você gosta”, justifica. Lincoln descobriu o facebook ao ouvir comentários de seus amigos e logo decidiu entrar para a comunidade. “Achei muito fera, me cadastrei e visito todo dia”, conta.

Para o estudante de Cinema Flávio Geromel, de 31 anos, Lincoln é uma das principais razões que torna o Beirute um lugar especial. “Gosto de me sentir em casa e ser bem atendido. O Beirute virou um desses lugares, já é minha casa. E não tem melhor atendimento que o do Lincon. Ele é bom de papo, divertido e está sempre de bom humor. Onde já se viu um garçom te cobrar em uma mensagem do facebook o porquê de você estar sumido? Este rapazinho não é apenas mais um garçom, é um amigo, e dos bons”, explica.

Modesto, Lincoln diz achar que desempenha razoavelmente bem seu trabalho. “Não procuro ganhar apenas minha gorjeta de hoje e, sim, fazer meu cliente de hoje. Atendendo sempre bem, de bom humor e com alegria, tenho certeza de que logo não terei apenas mais um cliente, mas um grande amigo”, revela o goiano de sotaque forte, apesar de residir em Brasília há quase dez anos.

O nome de Lincoln é uma homenagem ao ex-jogador do Goiás – “um craque”, nas palavras do garçom –, conhecido também pela torcida esmeraldina como Leão da Serra. Segundo o garçom, a ideia não foi de sua mãe ou de seu pai, mas de seu irmão mais velho, “completamente apaixonado pelo Goiás Esporte Clube”. Sua mãe aceitou a sugestão ainda grávida e hoje Lincoln se envaidece da forma como é chamado. “Sou muito orgulhoso desse nome que ele escolheu e pelo seu amor pelo clube que também sempre amei. Eu o conheci e ele [o jogador] é de um caráter excepcional, boa pessoa e muito trabalhador”, declara.

Há locais que atraem o cliente pela comida, pela beleza do lugar ou pelo preço barato. No Beirute, Lincoln é definitivamente um dos maiores diferenciais que mantém as mesas ocupadas em quase todos os dias da semana. Obviamente que isso não desmerece outros funcionários (como Marcão, André, Cícero e companhia) ou serviços do bar, mas é preciso dar crédito a uma das figuras mais queridas, profissionais e amigas da cidade. A capital agradece, Lincoln!

Publicado na 4ª edição da revista MeiaUm


Lincoln à paisana

segunda-feira, 13 de junho de 2011

O impasse de usar um casaco de pele

No segundo sábado de junho, acordo cedo para começar a maratona de arrumações para casamento: pés, mãos, clareamento, sobrancelha... E, no meio da atualização da vaidade, um probleminha: nos últimos três dias, o mês de junho chegou pra valer em Brasília. Sair direto do trabalho para um happy hour, desprevenida de casacos, tinha o lado bom de ser insuportável ficar muito tempo na rua – uma bela economia. Voltando ao “probleminha”... O que usar para não morrer de frio naqueles vestidos?

Não tive tempo para decidir a minha política àquela altura do campeonato. Então, pela primeira vez, fui a uma loja para alugar um casaco de pele. A parte da “pele” me incomodou, mas, com o deadline a bater à porta, não hesitei, a não ser no instante de entregar o cheque caução de R$ 2.900. Fiquei com medo de sujá-lo ou alguém roubá-lo. Pensei em me esquentar nos braços do meu namorado, mas passar cerca de sete horas agarrados seria inviável. Entrego o cheque e volto para a casa para terminar a correria: tomar banho, secar e arrumar o cabelo, maquiar, escolher sandália, bolsa...

Ao chegar a casa, deixei-o dentro da sacola para não provocar minha irmã, bióloga. Mas não escapei do deu dedo em riste: “que horror”. Minhas únicas justificativas eram o frio e a falta de tempo para pensar em outra coisa. E detive-me em pensar que o bichinho, mais precisamente, a chinchila, foi encontrado morto e aproveitaram para fabricar o casaco. Este foi o meu consolo, não pela crítica da minha irmã, mas porque sempre fui favorável às manifestações a favor dos animais. Sacrificar um animal simplesmente para uma dondoca se esquentar, ou melhor, se exibir, nunca foi minha defesa. Mas precisei vestir a minha condenação.

Na segunda-feira, não soube dizer o que mais me deu alívio. Devolver o casaco ou receber meu cheque caução. Não ver mais o casaco no quarto e rasgar o cheque foram experiências igualmente tranquilizadoras.

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Descobrindo a tranquilidade do shopping aos domingos

A convalescença de uma gripe fez o meu namorado e eu, na função de enfermeira, passarmos parte do nosso domingo no Conjunto Nacional. Definitivamente não seria o melhor programa, mas, cansados de ficar apenas em casa justo num fim de semana e com pouco tempo antes de uma viagem em que ele precisa se preparar para uma temperatura de -17°C, a ideia veio a calhar.

Que maravilha! Estacionamento vazio! Logo me animei com a andança que começava. Pouca gente circulando nos corredores e lojas tranquilas, sem alvoroço. A cada coisa que procurávamos, achávamos de imediato. O melhor de tudo, além da sorte de encontramos rapidamente o que precisávamos, era o bom humor dos vendedores. A simpatia era a marca de todos os funcionários que nos atenderam nas seis lojas em que entramos.

Acho que estou acostumada a ser mal tratada porque cheguei a me assustar com tamanha gentileza dos vendedores. Não é comum assim sermos bem atendidos em vários estabelecimentos. Todos sorridentes, com prazer em atender, oferecendo dicas de onde poder achar determinado produto, e, melhor, dando desconto sem nem precisarmos “chorar”. Alheios aos cartazes espalhados pelo shopping, um dos vendedores precisou nos avisar da promoção e que, por ser domingo, concorreríamos com dois cupons (e não com um como nos outros dias da semana) a R$ 20 mil em compras.

Fiquei pensando sobre essa simpatia em que me vi cercada. Atribui a razão disso ao domingo, suposto dia reservado ao descanso dos trabalhadores. Será que, por ser domingo, com a maioria das pessoas descansando em suas casas, os vendedores estivessem mais bem dispostos a atender compradores em potencial? Por causa disso comecei até a achar o próprio dia de domingo um dia mais simpático. Digo isso porque normalmente é um dia insosso, sem graça, parado, “um dia que nem sequer venta”, como diz uma amiga querida.

Depois dessa experiência, vou tentar me animar mais aos domingos e tentar quebrar o estereótipo dos dias que não ventam. O próximo, então, promete: dia dos namorados. Certamente, será um domingo simpático, animado e aconchegante. Ou talvez por isso mesmo não sirva para quebrar o tabu e, então, terei de esperar o ooouuutro domingo e analisar melhor esses dias que, dizem, iniciar a semana.

Se não se mantiver a expectativa dos domingos simpáticos, espero ainda lucrar com a sorte e as gentilezas deste domingo único: meu cupom ser sorteado e, assim, eu e meu namorado sermos recompensados pela balada Santa Luzia na sexta-feira à noite e pela matinê no hospital sábado de manhã.

terça-feira, 3 de maio de 2011

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Domingo sem fim

Num domingo sem fim, volví os olhos a Vinicius. Como que cansada de qualquer coisa que eu inventasse para as horas passarem, lembro de haver ganhado um livro por ser, digamos assim, jornalista. Desde que o recebi, ansiava pela leitura. Mas resolvi dedicar o hábito, há algum tempo perdido, a certames públicos que, até agora, de nada serviu. E, por isso, ele (Vinicius) havia ido a outros olhos. De volta a minha prateleira, folheio e começo a ler aquele que um dia cunharam “meu poetinha preferido”.

Antes dele, motivo por que me cansei, joguei-me só ao sofá e, por coincidência, assisti a filmes sobre Zuzu Angel e Rubin Hurricane Carter, meio que querendo jorrar toda aquela TMP que chorava por dentro. Sorte de estar só nos dois momentos. Canso. Quero sair. Não. Melhor ficar em casa. A solidão invadiu-me neste primeiro domingo de fevereiro. Não, também não quero ver o Fantástico.

Leio O exercício da crônica e invejo os cronistas. Imagino que seja um escrever mais por prazer do que por obrigação. Uma escrita livre das amarras do lead, do factual e da linguagem direta, nua, crua, sem graça, limitada. O bom de ler (preciso voltar à literatura, mas preciso também insistir na carreira) é se transportar a outro mundo, é ser outra pessoa. Vi-me, descrita pelas palavras de Vinicius, sentada na poltrona a olhar através da janela e caçar algo que motivasse o surgimento de um texto.

Mas aí chega o Poema de aniversário e faz-me lembrar que isso acontecerá, não o poema, o aniversário, daqui alguns meses... Não sei se continuo Vinicius ou vou para o Regimento. Duas urgências. Preciso curar dois males. Mas decido continuar Vinicius... Quis um descanso depois de haver acordado às 6h da manhã em pleno domingo sem plantão, mas com um exame no qual permaneci sentada por quatro horas.

E do nada me bate a vontade de escrever. A inspiração que eu procurava para qualquer coisa, para escrever, para começar o dia, para dormir com o pensamento longe. Ler parece que faz escrever. A solidão parece que faz escrever. Cansar-se de qualquer coisa parece fazer escrever. E era tanto cansaço e nenhuma linha saía... Parece que palavras chamam palavras... Pensei em pegar um caderno, mas os punhos me doem ao menor esforço com uma caneta. Ligo o computador... Não tenho nada para fazer, são ainda 20h30...

Jogo quaisquer palavras. Não quero me preocupar se alguém vai ler, o que pode pensar um raro visitante, se sou “vaidosa” por escrever na primeira pessoa. Quis simplesmente fazer alguma coisa para as horas deste domingo interminável passarem. Quis logo outro dia chegar para um outro amanhecer talvez me trazer o inusitado, a surpresa, a mudança. A mesmice incomoda, maltrata, endurece, ensimesma. Tento mudar. Em alguns casos, a mera tentativa é crime. Tomara que, no meu caso, a tentativa seja suficiente para a mudança. E volto ao Poema de aniversário... E o domingo ainda não acabou...